Febre chikungunya avança em Minas e afasta servidores do trabalho
Em Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, enfermidade tira 4,5 trabalhadores de suas funções na prefeitura da cidade, em média, por dia
Minas Gerais segue na contramão do país em relação aos casos suspeitos de chikungunya. Enquanto maioria dos estados tem apresentado queda no número de notificações da doença, Minas teve alta e já contabiliza 18,4% do total de registros de todo o Brasil. Fica atrás apenas do Ceará em números absolutos de casos suspeitos. E os problemas causados pela enfermidade, principalmente as dores fortes, já alteram a rotina em municípios mineiros, como Governador Valadares, no Vale do Rio Doce. Somente na prefeitura, a média é de 4,5 servidores afastados por dia em decorrência da doença desde o início do ano.
A chikungunya tem sintomas parecidos com os da dengue, como febre, dor de cabeça, manchas no corpo e indisposição. Mas a característica principal é a dor forte nas articulações, por tempo prolongado. Por causa disso, o número de afastamentos do emprego tende a aumentar, como vem ocorrendo em Valadares, que tem o maior número de casos em Minas.
Dados da prefeitura local mostram que neste ano foram registrados 1.064 afastamentos de servidores por motivos distintos. Do total, 578 foram relacionados à febre chikungunya, o que representa 54,3% do total. Os números dos quatro primeiros meses do ano já se aproximam do total registrado em todo o ano de 2016, quando a administração contabilizou 1.283 funcionários em licença médica.
Os índices de afastamentos por chikungunya chegaram a atingir 65% do total de licenças na prefeitura local em março. “O LIRAa (Levantamento de Índice Rápido do Aedes aegypti) em dezembro estava muito alto, com 9,7% das casas com infestação, o que nunca tinha ocorrido na cidade. Em janeiro começaram os casos de servidores pedindo afastamento por chikungunya”, explicou o secretário municipal de Administração, Marcos Sampaio, ele próprio um dos infectados. Em março, acometidos pela virose já eram a maioria dos licenciados na cidade.
A situação provoca prejuízo para os cofres públicos. “Como tivemos um índice de afastamento muito alto e não havia tempo hábil para contratações, suprimos com o aumento de horas extras, que quase triplicaram no período”, conta. O secretário diz que alguns servidores ficaram até um mês sem trabalhar. “Tivemos pessoas que ficaram 30 dias afastadas. Eu, que já contraí a doença há dois meses, ainda sinto dores”, testemunhou.
A fotógrafa B.L.O., de 50 anos, também sente no corpo e no bolso os efeitos da doença. Ela suspeita de que tenha se contaminado em Governador Valadares no fim de fevereiro, e ainda sofre com sintomas. “O corpo todo dói. Da cabeça até o pé, em todos os locais em que há o encontro dos ossos, todas as articulações doem. Estou há dois meses sem trabalhar. Desde que fui diagnosticada, não consegui exercer minha profissão. Como sou autônoma, usei o atestado dado pelo médico para dar entrada no INSS, para receber e poder pagar pelos remédios, que são caros”, comentou.
O presidente da Sociedade Mineira de Infectologia, Estevão Urbano, chama a atenção para os impactos do avanço da virose. “Já sabemos que há potencial para um impacto social enorme. As pessoas podem se afastar não apenas por curto período. Algumas vão ficar meses sem condições de trabalhar, por causa das fortes dores nas articulações. O impacto é sistêmico”, comentou.
Minas é o segundo em número de casos
Minas Gerais concentra mais de 77% dos casos de chikungunya da Região Sudeste (veja mapa), segundo o Ministério da Saúde. Balanço divulgado pela pasta ontem, com dados acumulados até 17 de abril deste ano, mostram que há 7.936 diagnósticos suspeitos da doença no território mineiro, que na estatística federal fica atrás apenas do Ceará, com 17.012 notificações. Porém, números mais atuais da Secretaria de Estado da Saúde (SES/MG) já contabilizam 11.696 registros até 2 de maio contra 503 em todo o ano passado.
O quadro põe o estado em alerta. Segundo a SES, a alta já era prevista devido a uma conjunção de fatores: as condições ambientais favoráveis à proliferação do mosquito Aedes aegypti; o grande número de pessoas que ainda não tiveram contato com o agente causador; a circulação do vírus na Região Nordeste do estado; e a inexistência de uma vacina ou medicamento específico para conter a virose.
Dados do Ministério da Saúde mostram a situação crítica em várias cidades mineiras. Naquelas com população entre 100 mil e 499 mil habitantes, Valadares é a que tem a maior incidência da doença no país. É seguida por Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, e Caucaia, no Ceará. Em municípios com até 100 mil habitantes, Mathias Barbosa, na Zona da Mata mineira, tem o maior número de diagnósticos.
Historicamente, os casos das doenças transmitidas pelo Aedes aegypti têm redução em época de frio. Porém, o infectologista Estevão Urbano alerta que as notificações podem aumentar em cidades mais quentes. “Em locais mais frios, como no Sul de Minas, as viroses não se alastram, porque o mosquito morre. Mas, no caso das regiões Norte e Nordeste, onde as temperaturas são quentes, a tendência é continuarem em alta.”
‘Doenças do Aedes’ recuam no país
O número de casos suspeitos de dengue, chikungunya e zika tiveram queda expressiva nos primeiros meses deste ano no país, segundo dados do Ministério da Saúde. Até 15 de abril, foram registrados 113.381 diagnósticos suspeitos de dengue, 90% a menos do que no mesmo período de 2016. A queda de registros de chikungunya também foi significativa: 68%. O anúncio aponta redução de 135.030 casos suspeitos para 43.010. Já a zika teve queda de 45% em relação ao mesmo período, chegando a 7.911 suspeitas neste ano.