Surto de febre amarela pode ter relação com tragédia de Mariana
De acordo com bióloga, o aumento do número de casos de febre amarela no leste de Minas Gerais pode estar relacionado com a contaminação do Rio Doce pelas barragens de minério
O rompimento da barragem da mineradora Samarco, em Mariana, na região Central de Minas Gerais, há pouco mais de um ano, pode ser um dos fatores que contribuíram para o surto de febre amarela no Estado. A bióloga da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Márcia Chame explica que o aumento de casos da doença acontece nos lugares que tiveram áreas ambientais degradadas. O desastre de Mariana destruiu praticamente toda região da bacia do rio Doce, onde está grande parte das cidades mineiras que registraram suspeitas e mortes da doença.
“A febre amarela no Brasil é silvestre. Você vê que os casos estão nas áreas rurais, onde o homem vai avançando nas matas e deixando pouco espaço para os animais. Esses bichos se aproximam do homem, fazendo com que ele entre no ciclo da doença, que era mantido na floresta no passado”, descreveu Márcia ontem à reportagem de O TEMPO.
Segundo a estudiosa – que coordena a Plataforma Institucional de Biodiversidade e Saúde Silvestre na Fiocruz – , a doença é cíclica e, geralmente, tem surtos que ocorrem de sete em sete anos no país. “Em 2009, tivemos um surto grande no Rio Grande do Sul (área que foi considerada livre da doença por mais de 50 anos), já houve em São Paulo e Tocantins. Correlacionamos o surto com 7.200 parâmetros diferentes, para ver qual consegue explicar”, esclareceu Márcia. Uma das hipóteses, segundo ela, é que o desastre de Mariana possa ter contribuído. “Houve uma degradação ambiental maior na região”, afirmou.
Márcia ressaltou que não se tem conhecimento ainda se esse é um motivo efetivo. “Nunca é uma causa única, é um conjunto de fatores. Nós já estamos estudando isso”, afirmou. Ela destacou ainda que a degradação da bacia do rio Doce iniciou antes do rompimento da barragem, em novembro de 2015.
Dados
Minas tem 133 ocorrências da doença sob investigação, sendo que 20 pacientes já tiveram o diagnóstico confirmado. Do total desses, dez morreram, e outras 28 mortes estão sendo apuradas, somando 38 possíveis óbitos por causa da febre amarela, neste ano, no Estado. Os municípios que tiveram o maior número de casos são Ladainha, no Vale do Mucuri, com 29 notificados, e Caratinga, na região do Rio Doce, com 23. Anteontem, o governo estadual decretou situação de emergência em 152 cidades.
Além dos casos em cidades mineiras, 11 macacos – que são hospedeiros do vírus – morreram na região próxima a Colatina, no Espírito Santo, que também foi atingida pela lama da barragem no rio Doce. Porém, ainda será investigado se os óbitos dos animais lá foram por febre amarela. No Estado vizinho, já foram registradas 80 mortes de macacos. Mudanças no ambiente podem deixar os bichos mais suscetíveis a doenças, explicou a bióloga da Fiocruz.
A febre amarela tem como vetor na floresta o mosquito Haemagogus, que recebe o vírus ao picar um animal contaminado e pode transmite ao homem numa próxima picada. Por isso, é importante manter unidades de conservação, para que os animais ajam como filtros da doença. “O homem está entrando e destruindo as áreas preservadas. E os fragmentos naturais têm que ser grandes suficientes para ter alimento para manter os animais ali dentro”, defendeu Márcia.
Fonte: O Tempo