Uma liminar judicial obrigou a Câmara Municipal de Governador Valadares (MG) a mudar a legislação adotada na condução dos processos de cassação dos 10 vereadores investigados na operação Mar de Lama. Na prática, os processos, que estavam em fase final de julgamento, voltaram à estaca zero, pois todo o procedimento anterior foi anulado.

Nesta segunda-feira (19), a Câmara retomou os processos de cassação contra os vereadores, investigados pelo recebimento de propina para a aprovação de leis que beneficiassem uma organização criminosa instalada na Prefeitura de Valadares e no Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) da cidade. O retorno dos julgamentos aconteceria após interrupção de mais de um mês, quando todos os investigados conseguirem liminares na Justiça.

Legislação
A mudança exigida pela liminar judicial aos processos ocorre porque existem duas leis pelas quais os vereadores valadarenses poderiam ser julgados e cassados. A primeira delas é a legislação federal do decreto 201, e a outra é a Lei Municipal 452. A Comissão de Ética da Câmara, que havia se formado para analisar os investigados na Mar de Lama, adotou a lei municipal, justificando que a lei federal tratava de dolo e que isto já estava sendo julgado pela Justiça. Tendo como objeto a quebra do decoro parlamentar, uma ação considerada de caráter subjetivo, a Comissão de Ética optou pela lei municipal.

Por esta razão, os 16 vereadores presentes à reunião extraordinária desta segunda-feira voltaram a decidir se acolhem ou não a denúncia contra cada um dos dez investigados: Adauto Silva (PROS); José Iderlan (PPS); Geovanne Honório (PT); Leonardo Glória (PSD); Marcos Silva, conhecido como Chiquinho (PSDB), Isá Batista de Souza (PDT), Ananias Paula da Silva, o Ananias Camelô (PSB), Ricardo Assunção (PTB), Cezinha Alvarenda (PRB) e Milvio José da Silva (PROS). Até a publicação desta matéria, ainda não havia resultado das decisões.

O vereador Carlos Nascimento, autor dos requerimentos que foram desarquivados para que os processos possam ser conduzidos pela legislação federal 201, questionou a decisão da Comissão de Ética. Para ele, a Comissão optou pela legislação incorreta de modo proposital, para dar tempo aos vereadores investigados, pois no momento não há mais tempo hábil para a condução dos processos de cassação.

“Eu entendo que quando esses vereadores optaram pela resolução 452 eles tinham total conhecimento que isso não daria em nada, eu avisei isso em plenário. Ao desarquivar os requerimentos para cassações, que eu apresentei em tempo hábil, é como se estivesse começando agora. Olha bem, no final da legislatura. Recebendo a denúncia, essa comissão vai ter que se reunir e vai ter que dar 10 dias para que façam a defesa. Vamos supor que façam isso amanhã, dia 20, a defesa teria até o dia 30; neste dia a Câmara vai estar fechada e no dia 31 encerra o ano e encerra a legislatura”, argumenta o vereador.

Em plenário, vereadores discutiam a possibilidade dos processos de cassação serem retomados pelos parlamentares que assumirem a partir de 1º de janeiro de 2017, mas o autor dos requerimentos não acredita que isso vá ocorrer.

“Pelo regimento interno da Câmara, todas as matérias que não foram aprovadas durante a sua legislatura serão arquivadas, exceto as matérias de iniciativa do Executivo, as matérias relativas a veto e tratos financeiros. O mandato desses vereadores encerra no dia 31 de dezembro, a outra Câmara vai julgar o quê?”, questiona Carlos Nascimento.

Renúncias
Durante a reunião da Câmara foi lido o pedido de renúncia de quatro dos vereadores investigados na Mar de Lama. Apresentaram renúncia de caráter irrevogável, por meio de carta, os vereadores Ananias Camelô, Mílvio José da Silva, Ricardo Assunção e Marinaldo Carlos de Amorim (PROS), conhecido como Zangado, o único que não corria o risco de ser cassado, já que teve o processo arquivado por não ter sido concluído no prazo de 90 dias, na época.

Apesar das renúncias, a vereadora Rosemary Mafra (PC do B) defendeu a continuidade dos processos contra os vereadores que renunciaram, mas o assunto não obteve consenso na Casa, que até a publicação desta matéria seguia em reunião.

Entenda o caso
Em abril de 2016, a Polícia Federal deflagrou a primeira e a segunda fase da Operação Mar de Lama, que investiga a atuação de um esquema criminoso que promovia o desvio de dinheiro público e fraudes em licitação na Prefeitura de Governador Valadares e no Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE).

Na primeira fase, oito vereadores foram afastados de suas funções por suspeita de colaborarem com a organização criminosa instalada na Prefeitura e no SAAE. Na segunda fase, outros cinco vereadores foram afastados. Segundo a Polícia Federal e Ministério Público, os vereadores da cidade recebiam propina para aprovarem projetos de lei que fossem do interesse da organização criminosa.