Estradas do Jequitinhonha: medo, revolta e perigo
A condição ruim da estrada de terra e a falta de segurança nas pontes já favoreceram a ocorrência de vários acidentes, com mortos e feridos na região
Medo e revolta se misturam quando os moradores do Vale do Jequitinhonha circulam pelos trechos de terra e atravessam as perigosas pontes de madeira da BR-367, como testemunhou a reportagem do Estado de Minas ao percorrer a rodovia. Entre Minas Novas e Chapada do Norte, há uma alternância entre asfalto e estrada de terra, com 13 quilômetros de chão. Na sequência, vêm mais 48 quilômetros de terra até Virgem da Lapa, passando por Berilo (a 20km de Chapada). Entre Almenara e Jacinto, há 12 quilômetros de terra de um total de 51 quilômetros. Outros 50 quilômetros, entre Jacinto e Salto da Divisa, também continuam sem asfalto.
As pontes, malconservadas, são estreitas, dando passagem para um veículo da cada vez, e não têm proteção lateral. Além disso, peças de madeira estão soltas, resultando em buracos. A primeira ponte fica sobre o Rio Capivari, perto da saída de Chapada do Norte para Berilo. No local, a reportagem encontrou José Roberto Alves (DEM), vereador em Berilo. “Uma ponte nessas condições é ruim para a nossa cidade e para a região”, lamentou Alves. Uma empresa que fazia a linha de ônibus entre Berilo de Virgem da Lapa (28 quilômetros) suspendeu o serviço há mais de um ano. “Para viajar de uma cidade para outra agora, quem não tem carro ou moto, tem que pedir carona”, reclama o aposentado José Cloves Gonçalves Silva, de 66.
Por causa de seus negócios, o comerciante de Jordânia Justiniano Primo de Souza sempre percorre o trecho de 62 quilômetros sem asfalto entre Almenara e Salto da Divisa. “Cada viagem é um tormento. Toda vez que pego a estrada rezo para poder voltar”, revela Justiniano. “O governo não olha para a gente. A região está abandonada.” O mototaxista Olindo Viana, de 55, que mora no município de Jequitinhonha, também confessa que sente muito medo ao percorrer o trecho entre Almenara e Jacinto, principalmente quando passa pela ponte sobre o Rio Rubim, a mais perigosa do percurso, que tem 71,6 metros de extensão sem grade de proteção. “Parece que o governo não gosta do Jequitinhonha. Isso aqui está esquecido”, diz Viana.
A condição ruim da estrada de terra e a falta de segurança nas pontes já favoreceram a ocorrência de vários acidentes, com mortos e feridos na região. Moradora de Jacinto, a pensionista Neuzi Rodrigues Pinheiro, de 60, disse que só viaja na BR-367 até Almenara porque não tem outro jeito. Em 15 de abril de 2012, um dos filhos dela, José Renilson, de 32, morreu de acidente no trecho, quando retornava do corte de cana no interior de São Paulo, para o velório do pai, José Pinheiro, de 58, que quase quatro meses antes havia sofrido um acidente na mesma BR-367 e ficou tetraplégico. “Se tivesse outro caminho, eu não passaria na ponte onde meu filho morreu. É dor de cortar o coração. A ferida sara, mas a cicatriz fica para sempre”, disse Neuzi.
O trecho da BR-367 entre Almenara e Salto da Divisa, mesmo com as más condições de tráfego e insegurança nas pontes, é muito usado para “encurtar caminho” do mineiro até o mar de Porto Seguro (BA). Em direção ao litoral baiano, muitas pessoas seguem pela BR-251 (partindo de Montes Claros) até Salinas, onde entram pela MG-342 (sentido Rubelita/Coronel Murta), alcançando a BR-367 a cinco quilômetros de Araçuaí.