O atropelamento de uma idosa por um coletivo da linha 82 do Move, no início da tarde de ontem, no Bairro Funcionários, Região Centro-Sul da capital, provocou apreensão em quem presenciou o acidente e disparou sinais de alerta no trânsito de Belo Horizonte. A sinalização ineficiente, que pode ter contribuído para o acidente, e o aumento do número de desastres envolvendo veículos do Move, implantado com pompa pela Prefeitura de Belo Horizonte em março de 2014, chamam a atenção para a necessidade de revisão do sistema pela BHTrans. Foram pelo menos 31 colisões ou atropelamentos envolvendo veículos do novo sistema desde sua implantação, segundo levantamento do Estado de Minas – o poder público não tem estatística de óbitos e desastres do tipo. Em dois anos, pelo menos 10 mortes foram confirmadas, sendo seis de motociclistas e garupas e quatro de pedestres. Neste ano, além da ocorrência de ontem, uma mulher teve as pernas esmagadas, em abril, na Avenida Paraná, por um coletivo da linha 50.

Já a vítima do atropelamento de ontem correu o mesmo risco. O pé direito da mulher ficou debaixo de uma das rodas do ônibus, o que obrigou o condutor do veículo a dar ré para que a vítima pudesse ser socorrida. A senhora, que tem 82 anos e mora em Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, foi encaminhada por uma equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) ao Hospital de Pronto-Socorro (HPS) João XXIII. No fim da tarde de ontem, a informação era de que a paciente estava fora de perigo, seu estado era estável e ela aguardava transferência para um hospital particular. O resgate comoveu quem passava pelo local e deixou o trânsito congestionado.

O acidente ocorreu quando a mulher tentou atravessar a Rua Professor Moraes, na esquina com a Avenida Getúlio Vargas, sentido Praça da Savassi. A travessia é feita em duas etapas, separadas por uma espécie de ilha de concreto na pista. A pedestre foi atingida pelo ônibus na primeira parte da transposição. O motorista do coletivo, Jorge Paulo Ribeiro, de 43 anos, contou aos policiais militares que registram a ocorrência que a vítima “atravessou a rua de uma vez” no momento em que ele saía da Getúlio Vargas para prosseguir na Rua Professor Moraes.

“A seta estava ligada, mas como o carro é muito grande, é preciso abrir o raio da curva. A senhora, mesmo acidentada, estava lúcida e disse que pensou que o ônibus seguiria reto e que, por isso, começou a atravessar”, contou Jorge, acrescentando que o ônibus estava com lotação média e que os passageiros presenciaram o ocorrido e se ofereceram como testemunhas.

A BHTrans não entende como errado o fato de que o coletivo faça a manobra de abrir o raio para fazer a curva. É bom lembrar que boa parte dos coletivos da linha 82 tem quase o dobro do comprimento dos ônibus comuns, sendo articulados e por isso apelidados de “sanfonas”. Apesar de a empresa municipal considerar normal a manobra, o local não tem sinalização eficiente para pedestres e motoristas.

Osias Baptista Neto, um dos principais especialistas em trânsito e transporte do país, observou que o número de semáforos para pedestres na ilha é insuficiente: “Há um equipamento, na ilha, virado para quem segue da Professor Moraes para a Getúlio Vargas. O ideal é que houvesse outro, virado para quem faz o percurso contrário”. O especialista acrescenta que, na falta desse segundo sinal, quem está na faixa de pedestres, entre a Getúlio Vargas e a ilha, tem preferência sobre o trânsito de veículos. Dessa forma, mesmo que o condutor do Move tenha sinalizado a conversão à direita com a seta, a preferência da travessia era da vítima.

A BHTrans reconhece que falta um equipamento para pedestre na ilha e garantiu que vai sanar o problema nos próximos dias. A empresa acrescentou ainda que aumentará o espaço físico da ilha – atualmente, os ônibus articulados passam por cima da área destinada ao pedestre para fazer a curva. Outras esquinas da capital nas quais a travessia de pedestres precisa ser feita em duas etapas reclamam melhor sinalização, o que aumenta o risco de acidentes.



FALTAM DADOS O poder público não tem informações detalhadas sobre desastres envolvendo o Move. No Hospital João XXIII, há levantamento relativo ao número de passageiros de ônibus (Move e linhas comuns) socorridos na instituição. Foram 288 entre janeiro e abril deste ano. Em 2015, no mesmo período, 311. Em 2014, 293.

Já levantamento do Sistema Único de Saúde (SUS) diz respeito ao total de óbitos por veículos pesados, o que inclui caminhões. Na capital mineira, foram 21 mortes entre janeiro e março de 2016. No mesmo período de 2015 e de 2014 não houve vítima. Em 2013, houve um óbito. Em 2012 foram três.

Tanto no caso do HPS quanto do SUS é importante destacar que as vítimas podem ter se envolvido em acidentes em outras cidades e encaminhadas às unidades de saúde da capital. O Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra-BH) optou por não comentar o assunto.